Olá, imparável. Salve Maria. Tudo bem?
Você lembra de ter ouvido falar sobre o canto das sereias que atraíam os marinheiros?
As sereias, depois de terem hipnotizado os marinheiros, os matavam.
Alguns marinheiros poderiam não saber sobre as sereias, mas isso não quer dizer que elas não os seduziriam.
Outros marinheiros poderiam dizer que elas não seriam capazes de seduzi-los. Mas, se nada fizessem para evitar isso, não quer dizer que estariam imunes.
Alguns poderiam acreditar que elas existiam, mas se nada fizessem, seriam mortos por elas.
E haveria aqueles que, sabendo que elas existiam, fariam algo para que isso não acontecesse.
Na mitologia grega, temos a história de Ulisses, que, após a Guerra de Tróia, desejava retornar para sua terra natal e reencontrar sua esposa, Penélope.
Sabendo dos perigos da jornada, Ulisses pediu conselhos à feiticeira Circe sobre como poderia atravessar a região das sereias sem cair na tentação de seu canto irresistível. Circe o orientou a tampar os ouvidos dos marinheiros com cera, impedindo-os de ouvir o canto.
Diferente de sua tripulação, Ulisses optou por não usar cera nos ouvidos, pois desejava ouvir o canto das sereias. Entretanto, para evitar que fosse levado à destruição, ordenou que o amarrassem ao mastro do navio. Ele advertiu aos marinheiros que, ao ser seduzido pela melodia, tentaria desesperadamente se libertar. Por isso, Ulisses instruiu seus marinheiros a ignorar suas ordens até que o navio estivesse em segurança.
E assim aconteceu. Ao ouvir o canto irresistível, Ulisses ficou enfeitiçado e suplicou aos marinheiros que o soltassem, mas, obedecendo às instruções, eles ignoraram seus pedidos. Quando o navio ultrapassou a área perigosa, os marinheiros o desamarraram.
Hoje, qual tem sido o nosso canto das sereias que nos hipnotiza e nos leva ao mundo das distrações?
O mundo das distrações.
Pesquisadores fizeram um estudo com 218 pessoas. Os participantes ficaram sozinhos em um quarto e não podiam fazer nada por 6 a 15 minutos. Durante esse tempo, podiam se autoaplicar choques elétricos.
Os resultados mostraram que 67% dos homens e 25% das mulheres escolheram levar pelo menos um choque. O experimento buscou investigar se as pessoas preferem qualquer distração, mesmo negativa, a ficar sozinhas com seus pensamentos.
Para Chris Hayes, no livro The Sirens' Call, o ser humano tem dificuldade em lidar com a solidão e com seus próprios pensamentos.
Imagine um rei com todas as suas riquezas. Sem nada para se distrair, ele se veria forçado a refletir sobre sua vida. Isso poderia deixá-lo infeliz — até mais do que o súdito mais simples.
Pouca distração pode nos deixar entediados, do tipo “não tem nada para fazer”. Muita distração pode nos deixar sobrecarregados.
Antigamente, no café da manhã, as pessoas liam os rótulos das embalagens para se distrair. Hoje, essa distração foi substituída pelo celular.
Tempos atrás, alguém poderia olhar com pena para uma família em um restaurante onde todos estivessem no celular. Hoje, essa mesma pessoa pode se ver nessa situação.
Sempre ouvimos que “tempo é dinheiro”. Mas e quando você está no celular e assistindo TV ao mesmo tempo? Onde está o dinheiro nisso? O dinheiro está onde está a sua atenção.
Atenção é dinheiro.
Vivemos agora na economia da atenção. Os algoritmos analisam aquilo que pode ser mais relevante para captar nossa atenção. Criam-se títulos para conteúdos que são verdadeiras iscas para serem clicados (clickbaits). Nossa atenção se transformou em mercadoria para as empresas explorarem através de anúncios.
As plataformas digitais trabalham para aumentar o tempo que passamos nelas. Criam recursos que nos levam a um vício comportamental, como passar o dedo para o próximo vídeo, sempre na expectativa de que o próximo seja melhor do que o anterior, gerando um mecanismo de recompensa.
Talvez não seja exagero afirmar que, para alguns, uma notificação do celular recebe tanta atenção quanto uma mãe que ouve o choro de seu bebê e corre em sua direção.
As pessoas temem ser “chipadas” pelo governo como forma de vigilância. No entanto, hoje carregamos nossos celulares nos bolsos e somos monitorados de forma tão intensa que nem percebemos. Se as pessoas costumam olhar o celular antes de dormir e essa é a primeira coisa que fazem ao acordar, os aplicativos conseguem deduzir nossos horários de sono. A geolocalização dos celulares sabe exatamente onde estamos. As redes sociais sugerem conteúdos que estão em alta de acordo com nossa localização. Fornecemos informações valiosas para as empresas e aplicativos que buscam captar nossa atenção no momento que consideram ideal.
Os celulares, como os cantos das sereias, tornaram-se uma atração irresistível. Se não tivermos cuidado, podemos nos desviar dos nossos objetivos e até enfrentar a morte espiritual.
Como se livrar das distrações deste mundo.
Segundo Chris, os celulares têm diminuído a qualidade das relações. As mensagens são rápidas e superficiais. Mesmo quando estamos juntos, não estamos realmente “presentes”.
Com as distrações, nossos objetivos podem ficar confusos, pois não conseguimos focar em atividades significativas. Perdemos tempo em distrações que poderiam ser evitadas. Essa falta de controle nos torna ansiosos e prejudica nossos prazos.
Dentre as várias recomendações de Chris, aqui estão 3 para se livrar das distrações geradas pelo celular:
Reconheça que o celular prejudica sua atenção. Assim como os marinheiros colocaram cera nos ouvidos para não ouvir as sereias, ao tomar consciência de que o celular está lhe prejudicando, você pode definir estratégias para manter o controle.
Controlar o tempo de tela. Use aplicativos para verificar seu tempo de tela e os aplicativos mais usados. Comprometa-se a reduzir esse tempo ou até mesmo a excluir certos apps.
Defina horários e atividades sem tecnologia. O que você poderia fazer sem o celular? Ler um livro, fazer um esporte, participar de uma comunidade ou, simplesmente, o silêncio.
As distrações nos afastam do silêncio, mas é nele que podemos encontrar Deus. Para nos aproximarmos d’Ele, precisamos cultivar momentos de recolhimento, livres de distrações.
“A contemplação é silêncio, este «símbolo do mundo que há-de vir» ou «linguagem calada do amor». Na contemplação, as palavras não são discursos, mas acendalhas que alimentam o fogo do amor. É neste silêncio, insuportável para o homem «exterior», que o Pai nos diz o seu Verbo encarnado, sofredor, morto e ressuscitado e que o Espírito filial nos faz participar da oração de Jesus.” (Catecismo da Igreja Católica CIC 2717)
É preciso sermos responsáveis pela nossa atenção.
Conclusão
Nossa atenção passou a ser uma mercadoria disputada pela economia atual. Os algoritmos procuram captá-la, e o celular tornou-se a porta de entrada para esse mundo de distrações.
Muitos preferem a distração a estarem sozinhos, mas é no silêncio que podemos encontrar Deus.
“Porque aqui está o que disse o Senhor Deus, o Santo de Israel: 'É na conversão e na calma que está a vossa salvação; é no repouso e na confiança que reside a vossa força'.” (Isaías 30, 15)
Que a paz de Jesus nos conduza ao silêncio, e o amor de Maria nos dê paciência para esperar pelo momento em que Deus quiser falar conosco. 💙
Nos vemos no próximo sábado!
Forte abraço!